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Discoteca Básica: meus 10 discos favoritos (de acordo com um certo livro)
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Pablo Miyazawa

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E se alguém te perguntasse agora “quais são seus 10 discos favoritos da vida?”. Quanto tempo você demoraria para responder?

Foi essa a questão apresentada aos participantes do livro “Discoteca Básica: 100 Personalidades e Seus 10 Discos Favoritos”, lançado ontem pela Edições Ideal. O projeto foi organizado pelo jornalista e meu amigo Zé Antonio Algodoal, que já fez de tudo um pouco na vida. Ele tocou guitarra na clássica banda Pin-Ups; trabalhou na MTV, onde dirigiu vários programas; foi o curador da exposição “Let’s Rock”, que ocupou a Oca no Parque Ibirapuera em 2012; e, recentemente, dirigiu o programa “Breakout Brasil” no canal Sony. Daí, no ano passado ele teve a ideia de elaborar um volume com as listas de 10 discos favoritos de 100 pessoas escolhidas a dedo. E lá foi ele atrás dos top 10, um por um, ao longo de vários meses.

livrodiscotecaTenho certeza de que você conhece boa parte das “personalidades” incluídas em “Discoteca Básica”. Entre os músicos, tem gente brasileira da velha guarda (Andreas Kisser, Edgard Scandurra, Arnaldo Baptista, Dinho Ouro Preto, Nando Reis, João Gordo, Supla, Clemente, Ritchie) e da nova guarda (Lucas Silveira, Helio Flanders, Adriano Cintra, China, Chuck Hipolitho, Leela, Rappin’ Hood, os caras do Cachorro Grande). Mas também tem integrantes de bandas gringas, como Superchunk, Teenage Fanclub e Stooges, além de VJs, jornalistas, fotógrafos, atores e atrizes, apresentadores, desenhistas, produtores e locutores. E, gentilmente, o Zé me convidou a participar também.

Aliás, peço licença a ele para postar aqui a minha lista, idêntica à publicada no livro. Tenho certeza de que isso não prejudicará em nada as vendas. Aliás, você tem mais 99 bons motivos para ir atrás de “Discoteca Básica”. Compre um para você, um para seu melhor amigo e aproveite e dê outro no amigo secreto na firma.

E reforço que a lista abaixo foi feita assim de repente, no calor do momento, sem pensar muito. Se eu fosse fazê-la novamente hoje, provavelmente seria bastante diferente. E tenho certeza de que a sua seria mutante também…

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Meu Top 10 de todos os tempos, por Pablo Miyazawa
São os favoritos, mas não os necessariamente melhores. Provavelmente são os que trazem mais sensações boas.

(Para ouvir os discos, clique no título de cada um para acessar a Rádio UOL, quando estiver disponível, ou pelos vídeos do YouTube)

The Beach Boys – “Pet Sounds” (1967)  O mais perfeito e eterno conjunto de canções já costurado em uma sequência lógica e intocável.

Miles Davis – “Kind of Blue” (1959)  A trilha sonora para voar, se esquecer da vida e pensar na vida, tudo ao mesmo tempo.

The Beatles – “Revolver” (1966) Não apenas uma das provas da genialidade dos Beatles, mas o melhor apanhado de canções pop em um só pacote.

The Ramones – “Rocket to Russia” (1977)  Não há tédio, cansaço ou tristeza que esse disco não cure.

Big Star – “#1 Record” (1972)  O melhor álbum de rock que quase ninguém ouviu, da banda mais subestimada de todos os tempos.

Nick Drake – “Pink Moon” (1972)  Uma profunda e dolorida experiência solitária, tal como uma conversa franca consigo mesmo.

Black Sabbath – “Paranoid” (1970)  É o disco que me apresentou a guitarra para eu nunca mais largá-la.

Pavement – “Crooked Rain, Crooked Rain” (1994)  Pureza melódica embrulhada em sujeira sônica, virtuosismo pop e irretocável senso de humor.

Weezer –  “Weezer” (1994)  Meu “guilty pleasure” favorito me soa como uma história de uma vida breve e feliz, com começo, meio e fim.

Creedence Clearwater Revival –  “Chronicle” (1976)  O bom e o melhor da maior banda norte-americana de rock por excelência.

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Quer ganhar um “Discoteca Básica”? Darei um exemplar de presente ao leitor que postar um top 10 pessoal de discos da vida mais interessante (na minha opinião, é claro), com suas respectivas justificativas. Escreva sua lista nos comentários abaixo. O resultado sai antes do final do ano, aqui mesmo no blog. Não esqueça de colocar seu nome verdadeiro para eu conseguir entrar em contato depois.


Entrevista: Real Estate apresenta no Brasil um dos melhores discos de 2014
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Pablo Miyazawa

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Real Estate (e Mondanile ao centro): apenas uns caras normais. (Reprodução/Facebook Oficial)

Hoje, 20 de novembro, tem show do Real Estate em São Paulo.

Para quem não conhece, é um grupo formado em Nova Jersey que lançou um dos melhores (e mais tranquilos) discos de 2014, “Atlas”. Dá para chamar de indie, dream pop, jangle pop, do que quiser (eu pessoalmente detesto rótulos). Eu só consigo definir a música do Real Estate como fácil de agradar a qualquer um que aprecie melodias tranquilas, guitarras dedilhadas e  um clima etéreo e de constante calmaria. Sem dúvidas, é música para baixar a bola, e não para estimular a adrenalina.

Hoje, quatro dos cinco integrantes vivem no Brooklyn (Nova York), enquanto um deles vive em Los Angeles. Conversei exatamente com esse cara, Matt Mondanile, guitarrista e um dos fundadores do Real Estate. Transcrevo a seguir trechos da entrevista que fiz no último sábado, dias antes dos caras pousarem aqui para dois três shows no Brasil – além de São Paulo (hoje, no Beco 203), tocam também na sexta (21) em Porto Alegre (Beco 203) e no domingo (23) no Rio de Janeiro (Circo Voador). (o show do Rio foi cancelado, desculpe a falha). Corra, que ainda tem ingressos.

***

“Atlas” é um dos discos mais celebrados de 2014. É interessante a naturalidade com que ele soa, traz uma sensação de amplitude, de disco ao vivo. Como funcionou o processo de composição?
Matt Mondanile: Bom, começamos a gravá-lo no começo do ano passado. Martin [Courtney], o vocalista, escreveu a maioria das músicas, e aí eu inventei as partes de guitarra pra elas, e o baixista [Alex Bleeker] veio e fez as dele. Nós ensaiamos muito até chegar ao ponto em que começamos a tocar com a banda toda, com o teclado e a bateria. Quando chegou a hora de entrar no estúdio, estávamos muito preparados e foi mais fácil de gravá-las. E sim, gravamos tudo ao vivo, e essa é a razão para o disco soar tão natural, o que é legal.

Quando vocês gravavam, chegaram a pensar: “Esse disco está saindo bom”? Ou não dava para saber o que esperar?
Um pouco dos dois. Algumas músicas, a gente não sabia no que ia dar. Mas você vai lá e faz o melhor que pode. Acho que todo mundo estava bem empolgado durante as gravações. Não dava para saber como sairia pelo menos até o finalzinho, então…

Algumas músicas são mais curtas do que deveriam ser. Aliás, o disco como um todo é muito curto, nem chega a 40 minutos.
Eu acho que só queríamos soar concisos. Se você nos assistir ao vivo, verá versões mais longas das músicas, com improvisos. Mas no disco nós fizemos uma versão concisa. Decidimos isso enquanto gravávamos: não queríamos que as coisas durassem muito ao ponto de ficar chato.

Você vive na Costa Oeste e o resto da banda vive do outro lado do país. Como funciona essa dinâmica para você? Não dá para ter uma vida lá muito normal.
É muito verdade. É super difícil ter uma vida normal estando na banda. Acho que mudar para a Costa Oeste foi bom para mim, porque eu queria muito morar aqui. E quando pego o avião para encontrar o grupo, a gente se junta na mesma cidade em que vamos tocar, já que não precisamos mais ensaiar. Então, é frenético – viajar quase toda semana, vivendo para voar. Mas gosto de viver em Los Angeles porque o clima é ótimo e o custo de vida é bem mais em conta para mim.

O Real Estate apresentou todas as faixas de “Atlas” em Nova York, em março passado. Veja o vídeo abaixo:

Você tem outro projeto, o Ducktails. Como faz para conciliar o Real Estate com seus negócios próprios? É difícil fazer algo seu enquanto se está viajando tanto com a banda principal?
É interessante, porque notei que é difícil mesmo balancear as duas coisas. Eu comecei a trabalhar em umas músicas no fim do ano passado, quando me mudei pra L.A., e só agora estou as terminando porque ando viajando muito. Então leva bem mais tempo do que antes, e faz você pensar: “Putz, o que estou fazendo não é bom.“ Eu percebi que não é bem assim – é difícil mesmo. E só agora estou conseguindo terminar umas faixas no estúdio. A ideia é finalizar o disco até o fim do ano ou começo do ano que vem e lançá-lo em maio. Mas é muito bom quando enfim se consegue equilibrar as coisas.

Você nasceu em 1985, então tem 29 anos. Que tipo de música você cresceu ouvindo? Deu tempo de escutar o Nirvana enquanto o Kurt Cobain ainda estava vivo?
Sim, eu cresci ouvindo essas bandas. As primeiras coisas de música que ouvi foram Ace of Base, Green Day, Beach Boys, Van Halen, eu era muito novo. Daí entrei no rock clássico, Led Zeppelin, coisas assim. Daí no ensino médio comecei a ouvir Weezer, Radiohead, Built to Spill, Modest Mouse, música indie. E no fim da escola eu só ouvia coisas experimentais e obscuras, noise, free jazz, John Cage, coisas esquisitas. Foi sair da escola para a voltar para o rock que eu gostava. Atualmente euouço todo tipo de música.

Você sente que, para a geração atual, os pré-adolescentes de hoje, as referências ainda são as bandas antigas dos anos 70 a 90? Não acha que as bandas de hoje não estão se tornando referências para a molecada?
Eu não acho. O que tenho visto recentemente é que, quando encontro gente nos shows do Real Estate, muitos garotos chegam e dizem: “Vocês são o motivo para eu ter começado a tocar guitarra”. Isso é muito legal e inspirador, e é o tipo de coisa que eu diria para, tipo, o Weezer, quando eu era mais novo. Às vezes você encontra uma banda que te faz querer fazer sua própria música. E essa é a única coisa que posso esperar dos fãs do Real Estate – inspirá-los a criar sua própria música. Com certeza ainda existem bandas de rock que inspiram a molecada.

Qual a idade média do público no show de vocês?
Acho que é uma gama diferente. Vai de 18 a 30 e poucos, até os 40 anos. Então temos um público bem diversificado. Outros artistas indie como o Mac Demarco tem um público mais jovem, mas nós temos todo tipo de gente.

É a sua primeira vez no Brasil, certo? Não sei se você imagina o que esperar daqui, o tipo de gente que vai ver, os lugares que irá conhecer. Qual é a sua ideia do país?
Não sei, não tenho nenhuma ideia. Nunca estive aí, mas quero ir. Estou empolgado para conhecer a América do Sul de um modo geral.

Como é ser o cara solteiro da banda? Os outros são casados, mas você não é, certo?
Não sou casado. Para falar a verdade, eu me mudei para Los Angeles para ficar com alguém, e nós terminamos recentemente. Ela é uma artista da [gravadora] Domino, a Julia Holter.

Desculpe, eu não sabia disso.
Sem problemas. Você pode publicar isso, é interessante. O negócio é que eu queria realmente estar num relacionamento com alguém que tivesse uma rotina parecida, que viajasse… Que tivesse um estilo de vida parecido com o meu. Mas aí você percebe que isso é mais difícil, porque você nunca vê a pessoa, já que estão os dois sempre viajando. Então é muito difícil estar em um relacionamento quando se viaja tanto.
Mas é legal ver que o Martin está numa relação há tanto tempo. Ele conheceu a esposa na época da escola, então já se conheceram antes de começarmos a fazer turnês com a banda. Eles passam muito tempo juntos e se entendem muito bem. É uma situação única. Agora que estou solteiro, está tudo bem. É divertido, eu gosto.

Você conhece seus parceiros de banda, Martin e Alex, desde a adolescência. Como está a relação de vocês hoje, que todos são crescidos, têm responsabilidades? Como a amizade evoluiu?
É ótima. Nós trabalhamos juntos, mas continuamos amigos. Eu gosto de viver em Los Angeles porque me dá a distância do lugar onde os caras vivem e de onde vivi a vida toda. A minha família é de Nova Jersey, então… É bom ter essa distância.

Então o fato de viver longe é bom para não se aborrecer com seus companheiros. Porque a vida na estrada pode ser um porre, não?
Pode ser um porre, mas na verdade é divertida se você fizer ela ficar divertida. Quando é um porre, fica difícil viajar. Mas é legal.

E como você a faz ficar divertida?
Você conversa com as pessoas, mantém o bom humor e não leva qualquer coisa para o lado pessoal. E tenta fazer a música o melhor que puder.

***

E veja aqui o Real Estate convidar Rivers Cuomo do Weezer ao palco de um festival em Los Angeles na terça-feira passada, para uma versão fiel até demais de “No Other One”, do clássico disco “Pinkerton”.

(Aliás, foi com esse cover que o Real Estate encerrou o show de hoje em São Paulo).


O Weezer quer retornar à boa vida de 1994. Mas o passado não tem mais volta
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Pablo Miyazawa

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Weezer 2014: Rivers Cuomo, Brian Bell, Scott Shriner e Pat Wilson (Foto: Kevin Winter/Getty Images)

Não há meio termo com o atual Weezer. Ou se ama, ou se odeia.

Com um disco novo lançado há menos de um mês, “Everything Will Be Alright in the End”, o nono da banda, produzido por Rick Ocasek, o Weezer propôs uma volta aos bons tempos. A proposta está descrita na letra do primeiro single, “Back to the Shack” (ouça aqui), na qual o vocalista Rivers Cuomo enumera o que não tem dado certo nas investidas recentes do grupo. A troca de instrumentos ao vivo – o baterista Pat Wilson assumia a guitarra, enquanto Cuomo se tornava apenas o cantor –, os flertes bizarros com produtores de música dançante, o afastamento do formato do rock tradicional e a alienação dos fãs antigos, que não conseguiam mais reconhecer a banda que aprenderam a amar nos anos 1990. Tudo isso em uma faixa de três minutos e que de longe é a mais pegajosa do novo álbum.

Outro verso que chama atenção em “Back to the Shack” é este: “Kick in the door, more hardcore / Rockin out like it’s ’94”. Ou seja, o Weezer quer retornar para “a cabana” onde estão os fãs antigos que se apaixonaram pela banda no primeiro disco, o “Blue Album” (1994). Só que se é uma promessa ou apenas uma intenção, não fica muito claro na primeira ouvida. “Everything Will Be Alright…” não engrena de cara e soa esquisito no contexto geral. Está claro que não é o Weezer da primeira fase que está ali. O senso geral pode remeter ao “Green Album” (2001), que a banda lançou após um hiato causado pelo fracasso de “Pinkerton” (1996), hoje o disco mais amado pelos seguidores devotos do Weezer. Certamente não soa tão superproduzido e inadequado como a maioria das faixas dos recentes “Raditude” (2009) e “Hurley” (2010). Talvez esteja no meio termo disso tudo, algo que lembra os razoáveis “Maladroit” (2002) e “Make Believe” (2005).

Há muitas teorias de fãs e jornalistas que explicam o porquê do Weezer dos primeiros anos ter se tornado algo tão diferente com a virada do século. Eu particularmente gosto da ideia que reivindica a real importância de Matt Sharp, o baixista que deixou a banda em 1998.

Sempre enxerguei Sharp como um integrante subestimado do Weezer. O potencial dele pôde ser provado nos vários ótimos discos que fez com seu projeto paralelo (hoje titular), o The Rentals. Mesmo esporádico e variando integrantes, o Rentals há quase 20 anos mantém uma identidade musical bem definida, combinando melodias delicadas (cantadas por Sharp e cantoras convidadas), instrumentos alternativos (violino, viola, teclado moog) e guitarra e bateria pesadas. O disco mais recente, “Lost in Alphaville”, já é um dos meus favoritos de 2014.

Infelizmente, não é possível provar que Sharp deixou uma marca musical tão profunda no Weezer apenas escutando os dois discos dos quais ele participou. Uma vez que as faixas eram compostas principalmente por Cuomo, pouco sobrava espaço para o baixista emplacar ideias prontas. Ele se fez ouvir principalmente nos backing vocals, agudos e dissonantes, que fazem a cobertura perfeita para o tom quase desafinado de Cuomo. Os discos sem Sharp sentem falta dessa harmonização especial que tão bem funcionou na primeira fase, mas não é só isso. Cuomo deve ter sentido a falta de um parceiro criativo como Sharp, ainda que a composição continuasse a cargo do vocalista. A teoria é a de que Sharp funcionaria como uma espécie de “ombudsman” de Cuomo, conforme este analista suspeita.

Sharp seria o ” olho crítico“ que conteria os impulsos mais pop/farofeiros de Rivers Cuomo. Ele, por sua vez, contaria fortemente com a opinião musical de Sharp, um músico versado em melodias e com uma tendência de composição mais lírica e harmônica, a respeito do caminho tomado pelas canções. Algumas já existiam antes do baixista entrar no grupo (“My Name is Jonas”, “The World Has Turned and Left me Here”), mas é indiscutível o papel exercido por ele em faixas de apelo agridoce como “Say it Ain’t So”. Sharp provaria de vez essa capacidade nas faixas que escreveu para o Rentals, que fundou ainda durante a permanência no Weezer.

É difícil para os nostálgicos não esperar do Weezer a mesma melancolia e o espírito indie dos primeiros discos (mesmo que tenham sido lançados por uma grande gravadora). O fato é que Rivers Cuomo nunca mais alcançou proeza semelhante às que realizou naqueles dois trabalhos. Aquelas músicas traziam características comuns, ainda que tão diferentes entre si. A maioria traz alternâncias entre acordes maiores e menores, que resultam em uma sonoridade mais obscura e emotiva, menos “animada”, principalmente no que diz respeito às melodias vocais. Os temas daquelas faixas também correspondiam a certo estado de espírito pós-adolescente beirando o jovem-adulto, confessional e menos preocupado com opiniões alheias.

As faixas do primeiro disco, escritas quando Cuomo tinha por volta de 21 anos, falavam sobre inadequação (“The World Has Turned and Left me Here”, “Undone”), nostalgia (“Buddy Holly”), problemas domésticos (“Say it Ain’t So”) e paixões adolescentes (“No One Else”). Já as de “Pinkerton”, escritas após o sucesso repentino, tentavam lidar com a fama (“Tired of Sex”, “The Good Life”) e relacionamentos (“Across the Sea”, “No Other One”, “Falling for You”), com apelo emocional elevado e incrementadas por arranjos complicados, virtuosismo, produção suja e uma nuvem nublada por cima dos vocais. Era um álbum mais depressivo, mas musicalmente superior. Só não fez tanto sucesso como o anterior.

Cuomo jamais se abriu tanto quanto em “Pinkerton”. As feridas estão expostas e ele canta de coração aberto sobre temas que seriam considerados reveladores demais, caso ele tivesse uma auto-percepção mais aguçada. Como o disco não foi tão bem recebido na época, o líder se viu envergonhado pelo exagero de sua entrega.  Entrou em crise criativa e a banda só voltou a gravar cinco anos depois. No meio do caminho, Sharp deixou o grupo (ou foi tirado? Isso nunca ficou claro). Quando retomou o Weezer, com a ideia de rejeição ainda pesando, Cuomo passou a filtrar os sentimentos que revelava descuidadamente. Resolveu se reinventar como compositor, e isso incluiu trancar os sentimentos embaraçosos e agir mais como um narrador das histórias alheias. Aproveitou para resistir aos acordes menores e a utilizá-los com parcimônia.

Não que fosse possível imaginar esse novo direcionamento. “Weezer” (2001), ou “Álbum Verde”, também produzido pelo mesmo Rick Ocasek, talvez seja o disco com menos personalidade do grupo. As tentativas de emular a vibração do primeiro sucesso – o conceito da cor da capa, o título, o produtor, a quantidade de faixas –, mostram que Cuomo ainda não estava certo sobre como sua nova persona musical deveria se portar. E os outros integrantes não se arriscaram a interferir no cérebro da banda. Músicas diretas como “Island in the Sun”, “Hash Pipe”, “Don’t Let Go”, todas pop até a medula, soavam como um outro Weezer, menos tímido e deprimido, mas ainda pisando em ovos, sem muita certeza de estar fazendo a coisa certa. E se não era a coisa certa, uma verdade ecoava: já não era a mesma banda.

Não dá para afirmar que o Weezer “feliz” do século XXI é pior do que o dos anos 1990. É apenas diferente. Não é tão raro Cuomo acertar na medida do power-pop melancólico, principalmente quando se volta para si mesmo e é nostálgico (“Memories”, de “Hurley”, é um bom exemplo da essência daquele velho Weezer combinada ao estilo atual). Mas ele se vê mais à vontade cantando sobre histórias inventadas do que abrindo o próprio coração. Ou quando o faz, ri de si próprio e não se leva a sério (como na esdrúxula “Pork and Beans”, do “Album Vermelho” (2008), ou mesmo em “Memories” e “Back to the Shack”). Talvez o anticlimax pós-“Pinkerton” tenha apenas catalizado a busca por esse caminho mais alegre, conformado e confortável com sua faceta pop. Ele aconteceria de qualquer maneira. E muitas faixas do novo disco comprovam essa incansável busca por aceitação, como “Ain’t Got Nobody”, “Go Away” e “Lonely Girl”, interessantes e até pegajosas, porém facilmente esquecíveis.

“Everything Will Be Alright in the End” tem uma proposta de volta às origens. Mas disco após disco, o Weezer mais parece tentar nos provar exatamente o contrário – que o passado ficou para trás e não tem mais volta. E isso só acontece porque todos somos pessoas diferentes no tempo presente. Rivers Cuomo cresceu, virou adulto, formou família, teve filhos e atravessou a crise da meia idade aos trancos e barrancos. Ele não poderia cantar e reclamar como um universitário rejeitado pelo resto da vida. Se hoje é outra pessoa, os antigos fãs também o são. E aqueles que conseguem compreenderam o Weezer de hoje é porque também aceitaram essa nova realidade.


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