Blog do Pablo Miyazawa

Dave Grohl é provavelmente o cara mais legal do rock – goste você ou não
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Pablo Miyazawa

davegrohl Getty

Para Dave Grohl, a vida está sempre jóia. Foto: Frederick M. Brown/Getty Images

Ontem o Foo Fighters apresentou uma música nova.

A faixa “Something From Nothing” é uma homenagem a Chicago, uma das oito cidades celebradas no disco-série-experimento “Sonic Highways”. Basicamente, Dave Grohl e seus comparsas criaram um lançamento multimídia robusto que deveria ensinar algo aos marqueteiros do U2 sobre como fazer barulho em cima de um novo disco. O single foi lançado oficialmente nesta sexta-feira, enquanto o disco completo chega às lojas em 10 de novembro.

Só que “Sonic Highways” não é só um álbum. O Foo Fighters escolheu cidades marcantes para a música norte-americana e gastou uma semana em cada uma. Instalou-se em um estúdio para ensaiar trechos de música e fazer jams. Entre as sessões, Grohl visitou e entrevistou figuras importantes da música local. O material em vídeo se transformou em uma série de oito episódios que começa a ser exibida hoje nos EUA, no canal HBO. No Brasil, “Sonic Highways” será exibida pelo canal pago BIS a partir de 30 de novembro.

As entrevistas de Grohl também inspiraram anotações que se tornavam versos para a música que era ensaiada. O próprio vocalista organizou e escreveu as letras e as gravou na hora com a banda. E isso se repetiu por mais sete semanas. “Sonic Highways” tem oito faixas, escritas e finalizadas cada uma em Chicago, Washington D.C., Nashville, Nova Orleans, Los Angeles, Austin, Seattle e Nova York.

Além disso, ao longo dessa semana, a banda promoveu a empreitada em cinco apresentações seguidas no programa de David Letterman.

Musicalmente, “Something For Nothing” é aquele Foo Fighters de sempre: introdução silenciosa, múltiplos riffs, guitarras altas e independentes, bateria pesada em meio-tempo e Grohl aproveitando para soltar a garganta como bem sabe fazer. Dada a natureza experimental de todo processo de composição do álbum, acho difícil encontrarmos entre as outras faixas algum hit persistente como “Everlong” ou “Learn to Fly”. Mas isso não seria novidade, visto que o Foo Fighters segue uma incômoda tradição de fazer discos irregulares, com metade de canções muito boas e a outra metade não tão inspirada (a exceção é o perfeito “The Colour and the Shape”, de 1997).

Do ponto de vista mercadológico, entretanto, o Foo Fighters dificilmente erra. O interessante é notar que um plano de lançamento tão bem calculado e ambicioso poderia impulsionar um efeito contrário: o de muita gente ficar de bode do Foo Fighters antes mesmo de o novo disco sair. Conheço muitos fãs incondicionais de Dave Grohl, mas me impressiona como tem gente que ouve rock e não simpatiza com o sujeito – e, consequentemente, com a atual banda dele. Seriam problemas o bom humor e o otimismo que ele exibe publicamente? Ou a sua onipresença constante na cena roqueira?

Capa completa de “Sonic HIghways”, previsto para 10 de novembro. (Reprodução)

Por outro lado, não há quem não respeite a trajetória dele como baterista do Nirvana. Concordo que são trabalhos diferentes e circunstancialmente únicos, e que ninguém é obrigado a achar o Foo Fighters maravilhoso só porque é a banda do sujeito que gravou o “Nevermind”. Mas creio que desde que recomeçou a carreira após a morte de Kurt Cobain, Grohl sempre trabalhou duro, foi eficiente e fez por merecer os muitos fãs que tem – além do título de “cara mais legal do rock”.

Sou daqueles que respeita e gosta do Foo Fighters, mas que prefere Dave Grohl na bateria. De qualquer forma, o considero um artista diferenciado e verdadeiro no que diz respeito ao esforço com que vende seu peixe. É um cara devoto à música e que ama o que faz, um guitarrista competente, um baterista excelente e o dono de uma das vozes mais marcantes do rock nos últimos 15 anos. Respeita seus mestres e se orgulha de compartilhar o palco com eles. Se Grohl é o grande “arroz de festa” do rock, é porque fez por merecer tocar com Paul McCartney, Jimmy Page, Robert Plant, Ozzy Osbourne, Tony Iommi e Bob Mould, só citando alguns.

Capa da “Rolling Stone Brasil” com Dave Grohl, de março de 2012. (Reprodução)

Capa da “Rolling Stone Brasil” com Dave Grohl, de março de 2012. (Reprodução)

Comprovei pessoalmente essa mítica simpatia quando o Foo Fighters foi a atração principal do festival Lollapalooza, em 2012. Eu havia entrevistado Grohl por telefone um mês antes, para a matéria de capa da “Rolling Stone Brasil”. Os 15 minutos programados se tornaram 30 apenas porque ele quis contribuir mais para o material. Foi simpático desde a primeira saudação e solícito durante todo o tempo. Bem preparado, rendeu frases fortes e não fugiu dos temas, falando inclusive sobre o Nirvana (que supostamente era um tema proibido da conversa). A revista vendeu bem, apesar da imagem da capa – Grohl oferecendo gentilmente o dedo do meio ao leitor, em uma foto não tão recente.

Em 7 de abril de 2012, dia do show, os produtores do festival avisaram que a banda me receberia. Às 19h, fui levado para a tenda atrás do palco onde eles atendiam executivos de gravadora (e suas famílias). Era a tradicional cerimônia de “meet and greet” a que os headliners em turnê mundial são obrigados a enfrentar – receber discos de ouro, apertar mãos e posar para fotos com convidados.

Após o assédio se dissipar, fui apresentado a um Grohl jovial e animado, vestindo camiseta preta da banda Mastodon, bermuda verde-oliva e o sorriso cheio de dentes. “Hey, man! How are you doing?”, saudou com um abraço e um “thanks” aparentemente sincero pela reportagem publicada. Encarando incredulamente seu próprio desaforo na capa da “Rolling Stone” que lhe entreguei, gargalhou e lamentou a falta de tempo desde o pouso no Brasil. “E já vamos embora amanhã!”, disse, ainda recebendo tapinhas nas costas e acenos à distância.

Nessa viagem, minha esposa veio comigo”, ele continuou, apontando para Jordyn, sentada em uma poltrona próxima. Ela se aproximou e Grohl nos apresentou. “Não trouxemos nossos filhos, deixamos as crianças em casa, com a minha mãe e a mãe dela. Estão com as avós, então somos só nós dois aqui na viagem toda, curtindo. No Chile fomos a uma vinícola, fizemos um jantar incrível…”.

E em São Paulo, conseguiram ver alguma coisa?

Fizemos porra nenhuma! Porque chegamos aqui ontem à noite”, ele faz careta, fingindo resignação. “É, eu sei. Então, da próxima vez, nós vamos chegar antes.”

E por que levaram tanto tempo para voltar aqui?

Honestamente? Eu estou feliz de termos demorado tanto para vir.” Ao perceber que poderia ser mal interpretado, ele fez questão de consertar: “Quero dizer, vou pensar em um bom exemplo. Ok: Espanha e Itália. Nós tocamos muitas vezes nesses países entre 1995 e 1998. Depois disso, a gente meio que parou de ir, porque havia outras partes do mundo pedindo para irmos fazer shows.”

O baixista Nate Mendel se juntou à roda enquanto o guitarrista Pat Smear folheava atentamente a revista. “Você a conheceu?”, Smear perguntou, apontando para uma foto de página inteira de Joan Jett. “Você deveria. Ela é maravilhosa!” Por coincidência, a TV ligada no canto da tenda indicava o exato início do show da cantora, no palco oposto. Algumas horas depois, ela estaria novamente em ação, dividindo duas músicas com o próprio Foo Fighters.

Grohl prossegue em sua tese. “Basicamente, voltamos à Espanha e à Itália no ano passado, porque não fizemos show nenhum lá em 12 anos. E foram do caralho. Todo mundo cantou as músicas. Já que não aparecíamos nesses países há tanto tempo, a ausência fez com que as pessoas quisessem muito aquilo. E daí fomos lá e ‘uhn!’”, ele bate na palma de uma mão com os dedos da outra. “Resultado: Foi o melhor show de todos os tempos. Agora, nós vamos retornar em breve. E será a mesma coisa com a América do Sul”, prometeu.

Acostumado a encarar multidões em caldeirões, Dave Grohl parecia genuinamente empolgado com a missão de entreter 75 mil brasileiros ansiosos. Inclusive, tinha pronto o plano para reverter a pressão e conquistar o controle logo de cara.

“A gente vai começar o show com ‘All My Life’”, ele disse em um sussurro, como se revelasse um truque sujo. “Espere só para ver o que acontece. É uma puta loucura!”


Bob Mould completa 54 anos. Sem ele não haveria Pixies, Nirvana e Green Day
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Pablo Miyazawa

Bob Mould se apresenta no Riot Fest, em Denver, em 21 de setembro último. Crédito: AP

Bob Mould se apresenta no Riot Fest, em Denver, em 21 de setembro último. Crédito: AP

Hoje, 16 de outubro, Bob Mould completa 54 anos.

Para quem sempre acompanhou a carreira dele, as próximas linhas poderão soar redundantes. Mould foi um dos fundadores do trio Hüsker Dü, que existiu de 1979 a 1988 e ajudou a abrir as portas do mainstream para o rock underground. Chame de punk, hardcore, pós-punk, power pop ou como quiser: o Hüsker Dü fez de tudo e influenciou quem estivesse por perto, e o frontman-guitarrista Mould era o seu enfurecido porta-voz (dividindo as funções de composição e vocais com o baterista ripongo Grant Hart). É mais do que certo decretar que se não fosse por eles, aquilo que um dia chamamos de “rock alternativo” soaria bastante diferente. O Pixies não seria daquele jeito, o Nirvana talvez nem existisse, o Green Day muito menos, e por aí vai.

Depois de uma dissolução amarga e mal-resolvida, Mould seguiu carreira solo e liderou outro trio de apelo mais adocicado, o Sugar. Se não experimentou tanta aclamação crítica quanto sua banda anterior, Mould se manteve em alta e gerou um dos discos fundamentais do rock noventista – “Copper Blue”. Dois álbuns e um EP depois, Mould seguiu experimentando, flertou com a música eletrônica e caiu em um ligeiro ostracismo. Chegou a desentender-se com o rock, mas fez as pazes em definitivo com o ótimo “The Silver Age” (2011). No mesmo ano, participou de uma faixa do Foo Fighters (“Rosemary”) e ganhou um show-tributo a sua carreira, com as participações de Ryan Adams e Dave Grohl. Aliás, foi Grohl quem declarou na ocasião, soando muito sincero: “Se não fosse por ele, eu não estaria fazendo música desse jeito, ou tocando guitarra como eu toco”. É justo.

Capa de “Beauty & Ruin”, disco mais recente de Bob Mould. Crédito: Reprodução

Capa de “Beauty & Ruin”, disco mais recente de Bob Mould. Crédito: Reprodução

Mould já havia se entendido como um roqueiro grisalho em “The Silver Age” e confirmou sua reconexão com o passado em “Beauty & Ruin”, desde já um dos melhores discos de 2014. Além de combinar com destreza os recursos musicais típicos de toda sua carreira – as guitarras ferozes, a velocidade do hardcore, a pureza acústica e as densas melodias –, ele finalmente se sente em paz com a época áurea do Hüsker Dü: na capa, uma foto de um Bob jovem, fumante e descabelado contrasta mesclada a uma imagem recente, sóbria, de óculos, touca e barba branca.

Do ponto de vista musical, a importância de Mould para o rock é inestimável. Mas existe um outro aspecto da vida pessoal dele que também merece atenção. No auge do sucesso do Sugar, em 1994, ele se assumiu homossexual em uma entrevista para a revista “Spin”. Apesar de aliviado, passou anos lidando com o tema de modo comedido, sem saber como agir e abordar a questão publicamente. Sentia-se desconectado da comunidade gay e pouco à vontade no papel de ícone. Somente em 2004, após o fim de um relacionamento estável de 14 anos, passou a se enxergar melhor resolvido e confortável na própria pele. Antes tarde do que nunca, Bob Mould finalmente está em paz. Essa história é contada sem meias palavras e com sinceridade tocante na biografia “See a Little Light: The Trail of Rage and Melody”, lançada em 2011 (inédita no Brasil).

“See a LIttle LIght”, a biografia de Mould, ainda está inédita no Brasil. Crédito: Reprodução

“See a LIttle LIght”, a biografia de Mould, ainda está inédita no Brasil. Crédito: Reprodução

Escrito em parceria com o jornalista Michael Azerrad, o livro percorre a infância brilhante e a adolescência confusa de Mould, enquanto oferece detalhes preciosos sobre a cena do hardcore norte-americano e a extenuante vida de uma banda na estrada. Mas é quando mergulha na autocritíca, já na meia idade, que a narrativa realmente comove: “Tive muita tristeza e arrependimento por não ter me assumido antes – minha vida teria sido tão diferente. Mas ficava tão preocupado sobre como assimilariam o meu trabalho que eu não considerava o impacto que teria nas pessoas por ser um roqueiro gay assumido”. Um personagem raro em um universo tão machista como o do rock de guitarras, Bob Mould talvez nunca irá obter a atenção que merece pelos tantos serviços prestados à música. Mas ele merece ser aplaudido ainda mais pela bravura de abrir o coração e dividir suas incertezas e convicções com o mundo.


Visite “Twin Peaks” enquanto ainda há tempo
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Pablo Miyazawa

twin peaks abertura Uma das melhores notícias das últimas semanas (pelo menos para mim) foi a volta da série “Twin Peaks”. O diretor David Lynch anunciou no Twitter que estaria se juntando ao roteirista Mark Frost para ressuscitar o programa que revolucionou a narrativa de ficção na televisão no início dos anos 1990. A terceira temporada está marcada para estrear em 2016 no canal Showtime, com nove episódios, exatos 25 anos após um desfecho repentino, sinistro e encharcado de explicações pendentes.

A placa não existe para valer – ela é uma pintura em um muro lateral do Cherry Cafe.

A placa não existe para valer – é só uma pintura em um muro lateral do Twede's Cafe, em North Bend.   Fotos: Pablo Miyazawa/Arquivo Pessoal

A importância de “Twin Peaks” talvez não seja compreendida por quem não acompanhou o seriado na época em que foi exibido originalmente (a Globo transmitiu as duas temporadas aos domingos, após os Gols do Fantástico). Algo incomum para uma época pré-internet, o irresistível gancho da trama – “Quem matou Laura Palmer?“ – gerou uma cobertura considerável da mídia e criou uma verdadeira mania em torno dos personagens bizarros e da ambientação surrealista da fictícia Twin Peaks. Lynch conseguiu transportar o espírito de seus filmes com perfeição para a televisão, além de extrair do elenco as melhores performances de suas carreiras. É fato que nenhum ator conseguiu brilhar da mesma maneira após “Twin Peaks” – nem mesmo Kyle MacLachlan, perfeito como o caricato agente do FBI Dale Cooper, a síntese do mocinho tradicional com camadas obscuras embutidas.

Por muito tempo o culto a “Twin Peaks” ficou restrito à memória dos fãs antigos e aos tímidos lançamentos em DVD. Tudo mudou quando as duas temporadas apareceram disponíveis no Netflix, seguido do relançamento da versão em Bluray acompanhada de muito material inédito. A ideia da volta da série já era persistente na internet, e a empolgação dos antigos simpatizantes contagiou os novatos nas redes sociais. Os produtores devem ter concluído que, caso voltasse, “Twin Peaks” teria um bom público para apreciá-lo, formado não só por velhos devotos, mas por muitos fãs recentes.

Lembro de assistir a vários episódios na Globo em 1990 e não entender muita coisa. Sabia que aquilo parecia importante o bastante para eu me interessar, mas a condução toda particular de Lynch pouco facilitava. A combinação “thriller de mistério barra pesada com um pé no ocultismo” funcionava muito bem para qualquer moleque interessado em filmes de terror e detetive. E intrigava ainda mais saber que o público adulto não estava sacando muita coisa também. Ao que parece, a sensação de “que diabos está acontecendo?” fazia parte da experiência de se apreciar Lynch no conforto do lar. Revi tudo no ano passado (inclusive o telefilme “Os Últimos Dias de Laura Palmer”) e reafirmei na hora a minha condição de fã.

No começo desse ano, tirei férias e fui para a Costa Oeste dos Estados Unidos. O plano era visitar Portland e Seattle e procurar o que pudesse haver de interessante no caminho. Já estava lá quando me dei conta de que as cidades que serviram de cenário para “Twin Peaks” ficavam escondidas na mesma região.

Fachada do Twede's Cafe, uma homenagem de North Bend a “Twin Peaks”

Fachada do Twede's Cafe, uma homenagem da cidade de North Bend aos fãs de “Twin Peaks”.

Com o carro alugado, saímos de Seattle em direção a North Bend, a 45 quilômetros de distância. O caminho é deslumbrante e silencioso, decorado por árvores imensas e montanhas nevadas ao fundo. Infelizmente (ou talvez felizmente), não existe uma cidade chamada Twin Peaks, mas North Bend não deixa o visitante esquecer que a série ganhou vida ali. Logo na entrada, o Twede's Cafe premia o turista com um letreiro e o slogan “a casa da torta de cereja de Twin Peaks”. O restaurante está localizado no mesmo terreno onde antes havia o Double R Diner ficcional, mas todo reformado – o local original foi destruído em um incêndio. 

O “damn fine cup of coffee & slice of cherry pie”, a atração principal do cardápio do Twede's.

O “damn fine cup of coffee & a slice of cherry pie”, a atração principal do cardápio do Twede's Cafe.

Por dentro, pode ser até um pouco decepcionante notar que o Twede's em nada lembra o aconchegante diner onde o Agente Cooper costumava tomar sua xícara de café. Gentis, os donos do estabelecimento ao menos tentam atiçar os fãs enquanto capitalizam com a onda: há fotos da produção nas paredes próximas ao banheiro e a famosa dupla “damn fine cup of coffee & a slice of cherry pie” são as estrelas do cardápio de apelo gorduroso. Eles também vendem um pôster ilustrado que indica as outras localidades onde a série foi filmada na região. Hoje, são muitos os sites que se dedicam a mapear os arredores e tais pontos de interesse. Existe também um evento organizado anualmente em North Bend para reunir os fãs e promover atividades lúdicas ligadas ao universo “Twin Peaks”. 

As Snoqualme Falls, com o “The Great Northern Hotel” ao fundo.

As Snoqualmie Falls, com o “The Great Northern Hotel” (ou Salish Lodge & Spa) à esquerda.

North Bend ainda abriga a escola onde Laura Palmer, Audrey Horn e Donna Heyward estudavam. A fachada é quase irreconhecível, mas está lá. Mais interessante é pegar três quilômetros de uma estrada local para chegar a Snoqualmie. A cidade abriga as icônicas Snoqualmie Falls, constantes na sequência de abertura e nas cenas de ligação de “Twin Peaks”. O local recebe centenas de visitantes diariamente, mas dava para ver que quase ninguém estava ali por causa do carinho pelo seriado: para a maioria, aquela é apenas um obrigatório ponto turístico do estado de Washington. Talvez isso venha a mudar com o renascido falatório em torno do programa.

O saguão do hotel onde foi filmado grande parte de “Twin Peaks”.

O saguão do hotel onde foi filmada grande parte de “Twin Peaks” pouco conserva o clima da série.

Outra cereja do bolo se encontra no mesmo local. Construído em um ponto privilegiado da cachoeira está o The Great Northern Hotel (ou Salish Lodge & Spa na vida real), onde o Agente Cooper permaneceu hospedado durante 25 episódios. Não há uma única referência à série e a decoração moderna de hoje em nada lembra o estilo kitsch da versão original, mas uma rápida apreciada no saguão já pode proporcionar flashes de cenas clássicas. Para os fãs, quase não fica mais “Twin Peaks” do que isso.

Não é muita coisa, mas já é o bastante para valer um divertido passeio de algumas horas. Não dá para ter certeza se Lynch e Frost irão produzir a terceira temporada nos cenários originais, mas certamente eles pensarão a respeito. Enquanto não temos certeza do que veremos em 2016, vale a pena planejar um “tour Twin Peaks” em algum momento antes disso. É claro, se a cotação do dólar permitir.


Quem não aprecia cultura pop bom sujeito não é
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Pablo Miyazawa

Quando fui convidado para fazer um blog neste UOL, o pedido do editor não poderia ser mais específico: “Quero que você seja o nosso colunista de cultura pop.”

O problema é que esse termo – cultura pop – sempre me deixou com o pé atrás. É algo tão amplo, significa tanta coisa ao mesmo tempo, que acabou banalizado, distorcido e incompreendido. Sempre que o assunto surge, eu me pego com problemas para definir essa história direito.

Vejamos o que diz a busca do Google. A indagação em inglês “what is pop culture?” traz 326 mil resultados. Em português, “o que é cultura pop?” retorna pouco mais de 75 mil páginas. Ou seja, não é exatamente uma pergunta atípica, muito menos o tipo de dúvida que fica sem resposta na atual era da informação.

Dá para explicar de muitos jeitos, alguns mais acadêmicos, outro mais coloquiais. Eu particularmente gostei do meio-termo desta definição aqui: “(…) é uma coleção de pensamentos, ideias, atitudes, perspectivas e imagens preferidas pela população mainstream”. Resumindo, cultura pop seria “uma espécie de denominador comum”, que engloba não só o entretenimento, mas as notícias e fatos envolvendo pessoas públicas (as tais “celebridades”), o esporte, a tecnologia e a moda, além da política e as relações sociais e suas ferramentas.

Também é aceitável definir a cultura pop como “o grupo de práticas e costumes reconhecido e aceito por um enorme grupo de indivíduos”. E inclusive é certo compreendê-la como “tudo que é produzido em massa para o consumo, com difusão na mídia e com intenção de atingir o grande público”. E interpretando matematicamente, cultura pop também é aquilo que sobra após descontarmos tudo o que for considerado “alta cultura”.

A cultura pop existe para ser reproduzida, consumida, apreciada e discutida. São temas que geram conversas, paixões e controvérsias, e nem sempre tratam de acontecimentos da vida real. Ela existe com os jovens em mente, mas pode ser recebida por adultos e pela “melhor idade”, sem restrições a gêneros e minorias. Ela é para todos, e todos deveriam aproveitá-la. Reinterpretando aqui um ditado popular, afirmo que quem não demonstra carinho por qualquer aspecto da cultura pop um bom sujeito não é.

O lado bom é que, apesar de ter um conceito tão amplo, a cultura pop pode representar ideias diferentes para cada pessoa. Para mim, que trabalhei a vida inteira transitando por esse universo, cultura pop é principalmente algo divertido sobre o qual sempre terei prazer e curiosidade em explorar e compreender melhor.

Costumo dizer que sou um jornalista de sorte, porque nunca consegui me distanciar da cultura pop na minha profissão. Durante oito anos editei revistas para o público infanto-juvenil na Conrad, uma editora cujo slogan orgulhoso era “a mais legal do Brasil”. Ali, escrevi sobre videogames, tecnologia pessoal, desenhos, filmes blockbusters, séries de TV e histórias em quadrinhos, tanto as de super-heróis ocidentais quanto os mangás lidos de trás para frente. Naquela época, entre o fim da década de 1990 e o começo do século, todos esses assuntos eram considerados “coisa de nerd”, sob um olhar longe do positivo por parte da grande mídia. Graças à democratização gerada pela internet, hoje, ser nerd é cool. Quem diria?

Em 2006, entrei na equipe da revista “Rolling Stone”, que estava prestes a ser lançada no Brasil. Apesar de a música ser meu assunto favorito, eu jamais havia trabalhado como jornalista nesse segmento. Mas fui lá para cuidar da “cultura pop” da publicação (e lá fiquei por quase oito anos, até junho passado). Apesar de ser conhecida por seu apelo musical, a “Rolling Stone” é um produto essencialmente dedicado à investigação da cultura pop – ou como bem definia o primeiro slogan, “tudo o que importa”. E esse “tudo” nada mais é essa cultura pop que sempre permeou meu trabalho e minha vida.

Nesse espaço, pretendo escrever sobre todas as coisas que considero interessantes, mas que acho que irão interessar a você também. Fazer um blog sobre um assunto tão amplo e divertido parece algo fácil – e é mesmo. O difícil é começar. Agora que o momento difícil já passou, que venha só a parte fácil e divertida. Espero você aqui comigo.